quinta-feira, 30 de outubro de 2008

Entrevista com Mariana Ximenes.


Mariana Ximenes chega esbaforida ao Hotel Santa Teresa (Rio de Janeiro), desce as escadas como vilã que foge no último capítulo da novela. Delito: está (pouco) atrasada para a entrevista. Afogueada, desanda a se desculpar...

Desfia explicações até perder o fôlego. Bobagem. Na verdade, tanto barulho por nada é conseqüência da vida que anda no prumo - uma besteirinha do cotidiano ganha status de problema. Melhor assim. Faz de Mariana o exato contrário de Lara, a sofrida personagem que interpreta em ´A favorita´.

Se a ficção é um vale de lágrimas fundo e dolorido, a vida real segue à base de sorrisos. Paulistana de 27 anos e beleza luminosa como um pôr-do-sol de outono em Ipanema, Mariana Ximenes está confortável no topo da carreira. Dribla polêmicas com ginga de ponta-esquerda, aposta no companheirismo e na ética como bússola e até as bissextas reclamações - a agenda cheia, os paparazzi sempre no encalço - são tímidas. Nada conseguem, diante do sorriso que parece tatuado no rosto.

´Meu plano é manter os laços de amizade que faço pelo caminho. Quero transbordar para toda a vida os laços feitos no trabalho. Gosto dessa palavra, transbordar´.

Paulistana carioca

´Adoro ir ao Leblon, caminhar no calçadão, curtir a cidade ao ar livre...´, festeja ela, que mora em Ipanema com o produtor de cinema Pedro Buarque, 43 anos, seu marido há sete. Mariana cumpre o script por inteiro. Habitué do Jobi e o Bracarense, senta à vontade com a galera na calçada, como qualquer mortal comum. É foliã sim, mas heterodoxa. Acha a Sapucaí bacana, mas prefere se acabar longe do bafafá de holofotes e camarotes. A protagonista é uma resolvida foliã do Cacique de Ramos, o bloco supertradicional que sai na Rio Branco. ´Sou mais do circuito alternativo, gosto de sair em bloco, de ir ao Candongueiro´, conta.

O despojamento apareceu na entrevista, na qual ela não usou jóias, sequer aliança - apenas um discreto par de brincos. Ao se deparar com um abricoteiro imenso, na entrada do hotel, não vacilou: resolveu subir para uma foto lá do alto. Com as coisas dando tão certo, não viu risco.


Leveza

A atitude tem nome: leveza, que pode servir de explicação para o sucesso de Lara, a sofrida protagonista que o destino lhe pôs no caminho. O papel guardava uma armadilha: rica e cobiçada, a personagem poderia acabar enjoada, e, em conseqüência, odiada pelo público. Mariana achou o tom certo.

´A intuição da Lara me encanta´, a atriz arrisca uma explicação. ´Por exemplo: só o público sabe que a Flora é a verdadeira vilã. A Lara intui´, acrescenta ela, que se desmancha em merecidos elogios ao trabalho de Patrícia Pillar.

Fazer o papel de má, aliás, está nos planos de Mariana, mesmo com sua estampa de mocinha de Hollywood. A beleza não vai virar prisão, avisa, sem medo de ter os papéis reduzidos pela característica que salta aos olhos. ´Quer coisa mais gostosa do que desconstruir a gente? Sempre penso numa composição de personagem, tanto no físico como no perfil psicológico. Tento mudar bastante de um trabalho para o outro. E estou aberta para a desconstrução´.

Desconstrução

Dela, podem surgir personagens de Machado de Assis, Nelson Rodrigues e, sobretudo, Clarice Lispector, que Mariana sonha interpretar no teatro, próximo capítulo planejado de sua trajetória. E clássicos do cinema? ´Vários. ´A malvada´, ´Crepúsculo dos deuses´, ´... E o vento levou´, ´A felicidade não se compra´, ´Janela indiscreta´...´, lista, achando ´uma honra!´, com exclamação e tudo, a constatação de que ela materializaria à perfeição uma loura de Hitchcock.

Seja qual for o próximo capítulo, não se avistam aborrecimentos no horizonte. Os poucos sufocos do ofício de atriz viram piada. Ela faz parecer que as quilométricas jornadas de gravação, tortura para muitos colegas, são folia e brincadeira. No fim da jornada, para relaxar, o Rio de Janeiro velho de guerra vem em socorro. ´Mergulho no mar. Limpa muita coisa´, receita, cheia de razão, diante da vida que vai em frente.

Fonte : Diário do Nordeste

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